‘Se não fosse a atuação do STF, teríamos muito mais mortos na pandemia’, diz Gilmar Mendes

O ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou neste sábado (27), que o Brasil teria ainda mais mortos na pandemia do coronavírus se não fosse a atuação do tribunal.

“Se não fosse essa atuação do Supremo, não teríamos esse número de mortos, teríamos muito mais. Seria uma tragédia. Naquele quadro, principalmente embalado pela mística ideia da imunização de rebanho, o Brasil teria se transformado em uma grande Manaus”, afirmou ele.

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Mendes foi um dos palestrantes do 13º Encontro Anual da AASP (Associação dos Advogados de São Paulo), realizado em Campos do Jordão.

O evento é realizado com apoio de OVALE, que faz uma cobertura especial durante os três dias do encontro na Serra da Mantiqueira.

Mendes também falou sobre a prisão em segunda instância e em trânsito em julgado. Acrescentou ter sido correta a revisão do STF em relação a esse tipo de prisão e teceu críticas aos métodos utilizados pela Lava-Jato, citando a necessidade do juiz de garantias no país.

 Leia a palestra completa de Gilmar Mendes:

 Nós temos vivido no governo Bolsonaro uma situação muito singular. Já no início de 2019 tínhamos manifestações que faziam no planalto federal contra o Congresso e o Supremo. Traduz muito a ideia de uma democracia iliberal. Sempre com cartazes escritos “eu autorizo”. Autoriza o que? Autoriza o presidente a fechar o Congresso Nacional e depor os ministros do STF?

Mediante a isso, uma decisão louvável do ministro [Dias] Toffoli, que delega o ministro Alexandre de Moraes como relator do inquérito contra os atos antidemocráticos, chamado de inquérito das fake news.

O que se desdobrou com a instauração do inquérito e o que nós descobrimos:

Por que não se deu essa função à PGR? Porque ironicamente parte dos ataques significativos vinham de grupos do Ministério Público Federal.

Era difícil esperar que o Ministério Público Federal atuasse de forma efetiva. Se criou uma espécie de estado paralelo.

Houve também o ato dos fogos sobre o Supremo Tribunal Federal pela Sara Winter e que depois se descobriu ter sido anteriormente financiado.

Se não fosse o inquérito das fake news, já teríamos tido algum tipo de descarregamento institucional. Eu reitero por isso que essa foi uma ação adequada e necessária do STF.

Depois do anúncio do inquérito é que descobrimos que empresários estavam financiando aquilo. Após aquelas ameaças, que não surtiram efeito algum, tivemos episódios que são dignos de republiquetas.

Tivemos aquele episódio do protesto com os tanques, que de tão velhos ninguém conseguia vê-los andar. Eles precisavam ser empurrados para andar. O que mais assustava era aquela fumaça que saía dos veículos. Ou seja, aquilo que era para se amedrontar e pressionar as instituições virou algo constrangedor.

Nós vemos aqui como uma democracia pode lidar com seus amigos. Com aqueles que querem usar das faculdades adquiridas para destruir a democracia.

Se formos ver por essas perspectivas, o governo Bolsonaro seja, desde Collor, aquele que mais sucumbiu dentro do parlamento. Vetos derrubados, medidas provisórias devolvidas, projetos desaprovados.

Todos lembram que Bolsonaro disse que não iria fazer o presidencialismo de colisão, mas iria fazer concessão para bancadas temáticas. O que significou na prática foi que, essas bancadas temáticas, do agro, da bala, da família, eram fiéis aos seus núcleos temáticos. Mas quando era pra se discutir temas como a reforma da previdência, não eram mais tão fiéis, pois olhavam seus próprios compromissos e o relacionamento com o governo esmiuçava.

Tinha-se temor do impeachment por conta da relação com o presidente da Câmara. Por temor, principalmente, pelo o que ocorreu com a ex-presidente Dilma [Rousseff].

Daí se dá o relacionamento inicial com o centrão e a ida para o presidencialismo de coalizão. E daí vieram algumas propostas como a PEC que acabou aprovada chamada de Kamikaze. Falemos agora do Supremo, a parte do inquérito das fake news.

Com a chegada da pandemia, nós tivemos um grande desafio. Na época, o ministro [Luiz Henrique] Mandetta que esteve aqui, disse e deixou claro que o que a OMS tinha recomendado era o correto. Que cuidados básicos como máscara e lavar as mãos sempre que voltar da rua seriam o adequado, e que não havia cuidados precisos ou o chamado “tratamento precoce”.

O governo e seu núcleo essencial repudiavam as medidas de isolamento social. E passou a tomar medidas que davam certas atividades como essenciais e que poderiam atuar.

O Supremo entrou no debate já que algumas cidades vieram ao Supremo, que baixou a norma e disse em alto e bom som que os estados e municípios tinham, sim, o poder de tomar decisões referentes à saúde, independente do poder da União.

Isso causou irritação e criou falsas narrativas de que o Supremo impediu o governo de atuar nessa temática e liberou estados e municípios.

Se não fosse essa atuação do Supremo, não teríamos esse número de mortos, teríamos muito mais. Seria uma tragédia. Naquele quadro, principalmente embalado pela mística ideia da imunização de rebanho, o Brasil teria se transformado em uma grande Manaus, onde tivemos um quadro vergonhoso onde pessoas morreram por falta de oxigênio.

Foi uma atitude totalmente responsável do tribunal, principalmente baseada em atos empíricos referentes ao tema. E sabemos que isso tem um preço. Principalmente nessa sociedade dividida. No ponto de vista institucional e político. O crítico do futuro fará justiça ao tribunal.

Se houvesse animosidade, Estado, cidades e municípios deveriam estar alinhados e tomando as mesmas medidas. Se tivesse essa união, as medidas poderiam ter sido muito mais racionalizadas.

Com a existência da vacina, com a criação, tivemos aquela controvérsia com a imunização. A vacina de SP, a vacina de [João] Doria, assunto que não deveria ter essa politização.

Foi o tribunal que entrou em jogo e obrigou o governo a apresentar um plano nacional de imunização. Algo óbvio. Algo que deveria ser legitimidade de forma natural. Olha a que ponto chegamos.

O ministro da época, [Eduardo] Pazuello, especialista em logística, seu nome não deve ser esquecido. Hoje temos trauma da palavra logística, dada à tragédia que ele criou na saúde pública. A tragédia só não foi pior, temos que enfatizar, por conta da ação condenada do Supremo.

Quem leu com atenção as revelações da vaza jato, e você de hora se identifica como um juiz tradicional, fica envergonhado quando ver um juiz indicando denúncia é testemunha para a indicação. Tudo isso nós tivemos nesse contexto, o que recomenda que iniciamos fortemente essa ação do juiz de garantias.

Encerro minha participação com a mesma pergunta que fiz no meu início: o que nós fizemos para permitir que chegássemos a esse ponto? Algo fizemos para permitir que chegássemos a isso.

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